terça-feira, 4 de janeiro de 2011

CEM ANOS DE SOLIDÃO POR CARYBÉ


Brincando de imitar o tom fantástico com que sua avó contava histórias de além-túmulo sem sequer alterar as feições do rosto, Gabriel García Márquez escreveu em 1967 a obra prima da América Latina, o que lhe rendeu, em 1982, o prêmio Nobel de literatura. Cem Anos de Solidão, afirmo com certo tom de segurança, é livro de cabeceira de todos que já o leram, e que dificilmente leram uma vez só, porque os intrincados galhos da árvore genealógica da família Buendía (todos com aquele ar de solidão), e os acontecimentos inexplicáveis de Macondo despertam no leitor um misto de sentimentos que vai do encanto à perplexidade, da alegria ao desespero, e faz o leitor, antes do último parágrafo, padecer da nostalgia de findar o livro.

Como para ajudar a imaginação, o artista argentino Carybé ilustrou o livro com desenhos que antecedem cada capítulo, traçados com o mesmo realismo fantástico contido na narrativa de Gabriel García Márquez. Tão perfeitamente combinam com a obra que é possível ir a Macondo e voltar apenas pelas ilustrações, embora elas só nos permita andar pela periferia do povoado; para adentrar no coração da cidade dos espelhos (ou das miragens) só mesmo lendo e relendo e mergulhando nesses cem anos.


01 - Melquíades, o cigano

"Um cigano corpulento, de barba rude e mãos de pardal, que se apresentou com o nome de Melquíades, fez uma truculenta demonstração pública daquilo que ele mesmo chamava de a oitava maravilha dos
sábios alquimistas da Macedônia. "






02 - José Arcadio Buendía, Úrsula e Prudêncio Aguilar morto.

   "[Tire isso] —  Se você tiver que parir iguanas, criaremos iguanas — disse — Mas não haverá mais mortos neste povoado por culpa sua."  



03 - Rebeca, a Buendía adotiva e o saco de ossos dos pais.

"No domingo, com efeito, chegou Rebeca. Não tinha mais de onze anos. [...]  Toda a sua bagagem era composta de um bauzinho de roupa, uma pequena cadeira de balanço de madeira com florezinhas coloridas pintadas a mão e um saco de lona que fazia um eterno ruído de cloc cloc cloc, onde trazia os ossos de seus pais."

04 - Cel Aureliano Buendía e Remédios, a jovem esposa

"A imagem de Remedios, a filha mais nova do delegado, que pela idade poderia ser sua filha, ficou doendo em alguma parte de seu corpo. Era uma sensação física que quase o incomodava para andar, como uma pedrinha no sapato."

05 - José Arcadio, o filho desertor

"Era José Arcadio. Voltava tão pobre como tinha ido, a ponto de Úrsula ter de lhe dar dois pesos para pagar o aluguel  do cavalo. Falava o espanhol com gíria de marinheiros. Perguntaram-lhe onde tinha estado, e respondeu: '“Por aí.”'

06 - Arcadio, o ditador de Macondo, e Úrsula

"Para que ninguém pusesse em dúvida a severidade dos seus propósitos, mandou que um pelotão de fuzilamento treinasse em praça pública atirando contra um espantalho. No começo, ninguém o levou a sério. [...] Mas certa noite, ao entrar na taberna, o trompetista da banda saudou Arcadio com um toque de fanfarra que provocou o riso da clientela, e Arcadio o mandou fuzilar por falta de respeito à autoridade."

07 - José Arcadio Buendía "louco" sob o castanheiro.

"Certa ocasião em que o Padre Nicanor levou ao castanheiro um tabuleiro e uma caixa de pedras para convidá-lo a jogar damas, José Arcadio Buendía não aceitou, segundo disse, porque nunca pôde entender o sentido de uma contenda entre dois adversários que estavam de acordo nos princípios. O Padre Nicanor, que nunca tinha encarado desse modo o jogo de damas, não pôde voltar a jogar. Cada vez mais assombrado com a lucidez de José Arcadio Buendía, perguntou-lhe como era possível que o mantivessem amarrado numa árvore.
— Hoc est simplicissimum: — respondeu ele — porque estou louco."

08 - Amaranta e Aureliano José

"Certa madrugada, na época em que ela recusou o Coronel Gerineldo Márquez, Aureliano José acordou com a sensação de falta de ar. Sentiu os dedos de Amaranta como uns vermezinhos quentes e ansiosos que procuravam o seu ventre. Fingindo dormir mudou de posição para eliminar toda e qualquer dificuldade, e então sentiu a mão sem a atadura negra mergulhando como um molusco cego entre as algas da sua ansiedade. Embora aparentassem ignorar o que ambos sabiam, e o que cada um sabia que o outro sabia, a partir daquela noite, ficaram mancomunados por uma cumplicidade inviolável."

09 - Assinatura do tratado de Neerlândia que põe fim à guerra civil

"O ato durou apenas o tempo indispensável para que se pusessem as assinaturas. Ao redor da rústica mesa colocada no centro de uma remendada barraca de circo onde sentaram os delegados, estavam os últimos oficiais que permaneceram fiéis ao Coronel Aureliano Buendía. Antes de recolher as assinaturas, o delegado pessoal do Presidente da República tentou ler em voz alta a ata da rendição, mas o Coronel Aureliano Buendía se opôs. “Não vamos perder tempo com formalidades”"

10 - Aureliano Segundo, criador dos animais que pariam desenfreadamente


Ao amanhecer, Aureliano Segundo abriu a porta e viu o quintal entupido de coelhos, azuis no resplendor da  alvorada. Petra Cotes, morta de rir, não resistiu à tentação de fazer uma brincadeira. 
— Esses são os que nasceram esta noite — disse. 
— Que horror! — disse ele. — Por que é que você não experimenta com as vacas?

11 - Fernanda del Carpio,  puritana, e sua camisola nupcial


Fernanda pusera uma camisola branca, comprida até os tornozelos e com mangas até os punhos, e com um buraco grande e redondo primorosamente caseado na altura do ventre. Aureliano Segundo não pôde reprimir um ataque de riso. 
— Isto é a coisa mais obscena que eu já vi na minha vida — gritou, com uma gargalhada que ressoou pela casa inteira. — Casei-me com uma irmãzinha de caridade.


12 - Remédios, a bela, subindo ao céu de corpo e alma

"Remedios, a bela, que lhe dizia adeus com a mão, entre o deslumbrante bater de asas dos lençóis que subiam com ela, que abandonavam com ela o ar dos escaravelhos e das dálias e passavam com ela através do ar onde as quatro da tarde terminavam, e se perderam com ela para sempre nos altos ares onde nem os mais altos pássaros da memória a  podiam alcançar."


13 - Cel Aureliano Buendía morre sob o castanheiro

" Então foi para o castanheiro [...]e ficou imóvel com a testa apoiada no tronco do castanheiro. A família não soube de nada até o dia seguinte, às onze da manhã, quando Santa Sofia de la Piedad foi jogar o lixo no quintal e lhe chamou a atenção o fato de estarem baixando os urubus."








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14 - Meme e Maurício Babilônia entre escorpiões e borboletas amarelas

Um projétil incrustado na coluna vertebral reduziu-o à cama pelo resto de sua vida. Morreu de velho na solidão, sem uma quixa, sem um protesto, sem uma só tentativa de deslealdade, atormentado pelas lembranças e pelas borboletas amarelas que não lhe concederam um instante de paz e publicamente repudiado como ladrão de galinhas.

























15 "Eram mais de três mil mortos. Todos os que estavam na estação"

"O menino descreveu com detalhes precisos e convincentes como o exército metralhara mais de três mil trabalhadores encurralados na estação e como carregara os cadáveres num trem de duzentos vagões e os atirara ao mar.




16 - Quase cinco anos de chuva em Macondo

Choveu durante quatro anos, onze meses e dois dias. Houve épocas de chuvisco em que todo mundo pôs a sua roupa de domingo e compôs uma cara de convalescente para festejar a estiagem, mas logo se acostumaram a interpretar as pausas como anúncios de recrudescimento.





17 - Úrsula, já bem mais que centenária, e Aureliano nu

Em casa, simplesmente acreditavam que tresvariava, sobretudo desde que dera para andar com o braço direito levantado, como o Arcanjo Gabriel.



18 - José Arcadio, o vaidoso, e os garotos.
"Em várias ocasiões, meteram-se na caixa-d'água, para ensaboá-lo dos pés à cabeça, enquanto ele boiava de barriga para cima pensando em Amaranta. Em seguida o secavam, botavam-lhe talco no corpo e o vestiam. Um dos meninos, que tinha o ca-belo louro e crespo e os olhos de contas rosadas como os coe-lhos, costumava dormir na casa. Eram tão firmes os vínculos que o uniam a José Arcadio que o acompanhava nas suas in-sônias de asmático, sem falar, perambulando com ele pela casa "
19 - Aureliano Buendía Babilônia e Nigromanta

"Nigromanta levou-o para o seu quarto iluminado com lamparinas de mentira, para a sua cama de armar com a lona manchada pelos maus amores e para o seu corpo de cachorra brava, insensível, desalmada, que se preparou para  espachá-lo como se fosse um menino assustado e se encontrou de repente com um homem cujo poder tremendo  exigiu das suas entranhas um movimento de reacomodação sísmica. Fizeram-se amantes."



20 - O Buendía com rabo de porco que põe fim à estirpe

Através das lágrimas, Amaranta Úrsula viu que era um Buendía dos grandes, socado e voluntarioso como os Josés Arcadios, com os olhos abertos e clarividentes dos Aurelianos e predisposto a começar a estirpe outra vez do princípio e purificá-la dos seus vícios perniciosos e da sua vocação solitária, porque era o único em um século que tinha sido engendrado com amor.

— E um antropófago perfeito — disse. — Vai se chamar Rodrigo.

— Não — contradisse o marido. — Vai se chamar Aureliano e ganhar trinta e duas guerras."

Depois de cortar o umbigo, a parteira pôs-se a remover com um trapo o ungüento azul que lhe cobria o corpo, iluminada por Aureliano com uma lâmpada. Só quando o viraram de costas é que perceberam que ele tinha alguma coisa a mais que o resto dos homens e se inclinaram para examiná-lo. Era um rabo de porco."

***

"O primeiro da estirpe está amarrado a uma árvore e o último está sendo comido pelas formigas."

"Porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão, não tinham uma segunda oportunidade sobre a terra"

Gabriel García Márquez


6 comentários:

  1. Adorei!
    Obrigada por compartilhar,me levou pra Macondo :)
    sucesso pra ti e pro Blog :)

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  2. Todos os desenho tem muito a ver com o que se imagina ao ler o livro que não tenho palavras pra falar o quanto gostei.
    Parabéns, pelo post.

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  3. Demais cara!!!!!!
    parabéns pelos post!

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  4. Cem Anos de Solidão é meu livro preferido.

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  5. Olá Danilo, adorei o post. De fato Cem anos de Solidão é meu livro de cabeceira desde a primeira leitura que fiz dele. E mesmo relendo-o todo ano, é impossível não me emocionar a cada quase morte do capitão Aureliano Buendía ou de me apaixonar junto com Rebeca por José Arcádio.
    Valeu!

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