Queremos que todos tenham boca.
Mais do que isso, queremos que todos falem, porque ser dotado de boca, língua e
voz não significa, necessariamente, que o indivíduo saiba se expressar. E deixa que digam, que pensem, que falem. A
minha opinião, que não é a de quem escreve, mas a de quem convive com o
assunto, é que a internet é um avanço extraordinário neste ponto, permite, a qualquer
um, uma forma de se expressar que antes só era dada aos jornalistas e artistas.
Hoje temos verdadeiros jornalistas escrevendo seus jornais pessoais, alguns tão capacitados quanto os que estão nas redações
ou nas rádios. Porém, como já era de se esperar, essa abertura, essa tomada de voz, gera alguns problemas que não digo sérios, mas chatos de lidar, e o maior
deles é a linha de pensamento que vem sendo criada através desse mundo livre e
virtual.
De uma forma ou de outra, todos
nós fazemos política. Mesmo a dona de casa que desliga a TV no horário eleitoral
e repete a cada dois anos “tudo ladrão” faz política. No Facebook não é
diferente. Na maior rede social do mundo proliferam imagens com mensagens de
ordem, revoltas digitais e resignações, seguidas por comentários simples, mas
que justamente por isso impactam e correm pela rede como um vírus maligno corre
pelas células do corpo. Onde está o problema? No conteúdo que vem se espalhando.
Pela mesma lógica que notícia ruim corre mais rápido do que notícia boa, textos
e mensagens puramente partidários, por assim dizer, que não representam nada de
proveitoso, são divulgados em uma velocidade assustadora e compartilhados entre
os nossos novos “intelectuais”.
A receita é simples e garanto que
todo mundo conhece. Uma imagem composta por uma foto, digamos de um disco
voador, sobreposta por uma mensagem curta de cinco ou seis frases, mais ou
menos assim: “enquanto o povinho idiota
assiste futebol ou dá beijinho contra o Feliciano, uma espaçonave alienígena
pousou no Brasil para implantar o comunismo. Votem no PT, povo otário”.
Pensam que estou muito longe da realidade? Juro que eu queria estar.
Ultimamente, se ficamos quietos somo,s criticados pelos intelectualóides por
estarmos quietos; se brigamos, somos bobos brigando pela causa errada; se
assistimos debates ou assinamos petições, somos ingênuos; se promovemos um
protesto, somos baderneiros que se manifestam por nada, sendo facilmente usados
como massa de manobra para algo obscuro seja feito. Vou ilustrar com a sensação
pop do momento: Marco Feliciano. O
que os nossos odiadores populares diriam do povo se aceitasse o pastor
criminoso sem maiores problemas? “Idiotas passivos”. Mas houve manifestação
popular sim, o povo foi a Brasília, brigou e ainda briga para fazer valer
qualquer coisa que seja mais digna dos Direitos Humanos que o Feliciano. Boa
atitude? Não! Massa de manobra facilmente usada para que o PT aprovasse a PEC
33 e tirasse do STF a soberania sobre o legislativo (processo ainda em
andamento).
Onde eu quero chegar com tudo
isso? Pois bem, não estão de todo errados os intelectualóides da escola
facebookana de ciência política. Sempre há (e sempre haverá) a estratégia de
conduzir o povo (TODOS NÓS) de olhos vendados para que os porões de Brasília
possam trabalhar em seus planos macabros. O problema é que, de todas essas
revoltas promovidas pela rede social, compartilhadas em suas teorias de cinco
frases, quase nenhuma é feita verdadeiramente com o intuito de resolver algo. A
questão está no partidarismo. No nosso governo, atualmente petista, as
mensagens são tucanas; daqui alguns anos, quando tivermos um governo tucano, as mensagens
serão petistas. É uma brincadeira de governo e oposição que os internautas “cabeças”
levam a sério sem perceber que eles é que estão sendo verdadeiramente
manipulados, muito mais do que o povão, a quem se dirigem com certa distância,
como se fosse algo de outro mundo. Não faz muito tempo, vi uma imagem em que
dizia que o povo brigava mais pelo direito de dar a bunda do que pelo direito
de ter um país honesto, porque a parada gay tinha muito mais gente do que a
marcha contra a corrupção. Desrespeitoso e hipócrita. Eu estive na marcha
contra a corrupção, e realmente, havia cerca de cem pessoas apenas gritando na
Avenida Paulista, mas o curioso é que a imagem que dizia isso já tinha mais de
mil compartilhamentos. A matemática é uma ciência exata e não é difícil deduzir
o nível de absurdo que temos aqui.
O meu apelo inútil é para que
quem se preocupa deveras com o país leia e compartilhe coisas verdadeiramente
úteis. Se jornalistas e cientistas políticos tivessem suas colunas tão lidas e
compartilhadas quanto essas imagens, é bem provável que eu não visse tanta
besteira, tanta infantilidade de quem pensa que é superior porque curtiu uma
página “politizada”. Deixa que digam, que pensem, que falem? Sempre! Porém, às
vezes essa liberdade exige muito da nossa paciência.
Danilo del Monte