quarta-feira, 14 de maio de 2014

REDONDILHAS ENGANADAS


É difícil de se ver
Um orgulho que impera
Escondido em um sorriso.
Pra quem pode perceber,
O peito aberto é’um aviso
De que o nosso vício ingênuo
Perde a passada na pressa
De seu próprio caminhar.



É difícil relembrar,
Por trás da doçura morta,
O amargo funeral.
Mas o réquiem já não há,
E a vela ainda acesa
Sobre um negro castiçal
Revela escultural
A vontade de fugir.


É penoso admitir
Que escondido no motejo
Há um sorriso de menina,
Mas podemos intuir
Que a mesma bailarina
Que dançava no cortejo
Esconjura as suas noites,
Incapaz de adormecer. 

É difícil de se ver...

Danilo del Monte

terça-feira, 6 de maio de 2014

SÃO PAIS E MÃES




Até o amor é compreensível.
Seja como um erro fatal e incorrigível,
Seja como um combustível que dá força
E que se esgota mais cedo ou mais tarde,
Como todo combustível,
De alguma forma é explicado e interpretado.

A saudade, por outro lado,
Assemelha-se mais a uma máquina de tortura medieval.
A vítima não sabe por que sofre, mas sofre,
E se destrói tentando entender
Como foi parar nas amarras mais antigas
E incompreensíveis da história humana.

No meu espírito masoquista que procura a dor,
Torci meu pescoço até que minha face ocupou
O lugar destinado a minha nuca.
Caminhei como quiromantes condenados
E atei-me, consciente e ingênuo,
Ao primeiro mistério do Tempo, chamado Saudade.

Estavam ali, junto comigo,
Tantos errantes, irresponsáveis e perdidos,
Todos sorridentes e tão despreocupados...
As bexigas ainda estavam penduradas,
As bolas, furadas pelos vizinhos rabugentos
E os papéis, coloridos e amassados, jogados para um canto.
Havia gente que ria,
Mas havia muito mais gente que chorava,
No entanto, não havia tristeza e nem angústia,
Mas sim uma mera dor momentânea
De um tropeço em alta velocidade
Que termina com a cara rastejando pelo chão.

Senti que algumas lágrimas molharam minhas costas.

Quando voltei à forma original,
Isto é, com o rosto alinhado à direção dos pés,
E resolvi de cara e coragem mirar o presente,
Percebi que o flagelo pesava muito mais,
A ponto de ser quase impossível carregá-lo.
Vi pais e mães sentados ao redor de um berço
E tantos homens sérios vestidos a rigor.
Vi buquês, vi bolos, vinhos e espumantes
E vi decorações infantis num salão vasto e colorido.
Vi romances acorrentados em papéis,
Presos entre paredes brancas e telas de proteção,
Gritando desesperados por uma efêmera ilusão de liberdade.

Quando abandonei a maldição dos quiromantes
Senti desfalecer no espaço-tempo
Algo que, por ser desnecessário formalizar,
Nunca teve nome e nem sobrenome,
Mas que costumávamos chamar Realidade.

Danilo del Monte